JUDICIALIZAÇÃO NA SAÚDE: NÃO ACREDITE EM TUDO QUE LÊ!

Bom senso é o primeiro passo para não inviabilizar o setor

Frequentemente, somos assediados por textos que aparentemente defendem o cidadão, a sociedade e, em última análise, o consumidor. Criticam as instituições, as autoridades, os serviços prestados, os profissionais, as empresas etc., principalmente no Setor Saúde. Induzem o leitor a sempre ir à justiça buscar “seus direitos” e, como exemplo, mais uma matéria replicada nos últimos dias por alguns sites/portais, cujo texto chega a afirmar: “diante de eventual negativa por parte das operadoras na cobertura das despesas de home care, o paciente ou seus familiares podem e devem recorrer ao Judiciário”.

Esse tema, Saúde, é uma área fértil para cativar, cooptar e influenciar o leigo e, muitas vezes, até os profissionais da área, levando-os a agir em direção aos interesses do autor do texto, interesses esses que visam menos esclarecer ou melhorar a situação do leitor, inexperiente com relação a esses assuntos, e mais ampliar a demanda por serviços de interesse do autor ou de um setor específico.

Ao ler esse tipo de artigo, é preciso refletir, pesquisar, esclarecer dúvidas, conhecer o perfil de quem escreve, avaliar quais os possíveis interesses desse autor, entender a questão para, depois, formar juízo de valor a respeito do tema.

A Atenção Domiciliar (atendimento domiciliar, assistência domiciliar, home health care, home care etc.) é um desses temas cuja imaginação pode influenciar positiva ou negativamente qualquer texto desenvolvido sobre o assunto, que é amplo, complexo e ao mesmo tempo antigo. Dependendo do grau de intimidade que a pessoa tenha com o tema, variam os modelos mentais referentes a ele. Isso é decisivo, pois essa variedade de entendimentos impacta diretamente na expectativa e percepção dos serviços prestados e, muitas vezes, são modelos muito distantes da realidade plausível, necessária e viável.

A Saúde é um tema que contém forte viés emocional e, como tal, terreno fértil para canalizar sentimentos reprimidos, frustrações e a impotência frente à natureza, semeando facilmente o conflito e o inconformismo. Infelizmente, os profissionais da área não são preparados academicamente para esse ambiente em que se desenvolve sua profissão, enfrentando frequentemente dificuldades de comunicação e relacionamento, nem sempre por falta de experiência ou preparo, mas sim por falta de tempo e paciência.

Num setor em que a forma artesanal de prestar serviços é fundamental, o acesso e a dinâmica da assistência se impõem, o tempo se torna escasso e o profissional, por sua vez, economiza tempo naquilo que acha menos impactante para a atenção ao doente: comunicação e relacionamento. Entretanto, o sucesso da prestação de serviços na saúde é moldado na relação médico-paciente, conceito esse que pode e deve ser generalizado para relacionamento família-profissional de saúde. Notem que o que separa as duas palavras é um hífen, simbolizando “e” ou “+”, e não um “x”, simbolizando “contra” ou “versus”, pois são personagens importantíssimos para qualquer procedimento envolvido na atenção à saúde.

Dessa forma, no âmbito da saúde assistencial, os tratamentos, soluções, conflitos, orientações, expectativas e evolução clínica envolvem relações humanas, conversa, orientação, dúvidas e atos. A melhor forma de equacionar tal situação é expor cada ponto de vista, dúvidas, necessidades, percepções, de forma franca e objetiva entre as partes envolvidas, pois as ações necessárias comumente são dinâmicas, exigindo agilidade para sua resolução.

De maneira geral, a interposição de terceiros ou do sistema judiciário, de forma rotineira, cria mais obstáculos do que soluções benéficas ao paciente. Quebra totalmente um vínculo baseado na confiança, transformando-o num jogo de desconfiança, chantagem e burocracia, tornando uma situação por si só estressante num conjunto de sentimentos como raiva, angústia, ansiedade, desrespeito e beligerância. Esse ambiente não traz proveito nem para o paciente, nem para a família, nem para os profissionais, nem para as instituições. Só ganha o terceiro interessado.

O enunciado da Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990), em seu Art. 3o, apresenta o seguinte texto:

“A saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do País.

Parágrafo Único – Dizem respeito também à saúde as ações que, por força do disposto no artigo anterior, se destinam a garantir às pessoas e à coletividade condições de bem-estar físico, mental e social.”

Entretanto, o dever do estado não exclui o dever das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.

Comumente, o que o paciente precisa é de Cuidados. Dentre os Cuidados, encontra-se a Assistência à Saúde. “Cuidado” é o termo amplo que a sociedade utiliza para definir as necessidades que um paciente (ou um deficiente) tem e que precisam ser providas por outra pessoa ou que requer capacitação e treinamento do próprio paciente e/ou de seu cuidador, no sentido de conferir-lhe independência e autonomia sempre que possível, como premissa básica da saúde.

Inferir que a necessidade de Cuidados Básicos seja indicativa de recursos permanentes de Atenção Domiciliar profissional é, no mínimo, simplificar irresponsavelmente o assunto ou tendenciar o debate de forma a conduzir o raciocínio de forma enviesada.

A melhor maneira de evitar dissabores na obtenção do serviço de Atenção Domiciliar é entender o que é e o que não é este recurso, quais suas indicações precisas e quais os seus objetivos, que são planejados e adequados para cada paciente, considerando suas circunstâncias.

Diretoria NEAD